INCLUIR É HUMANIZAR CAMINHOS

Claudia Werneck


 

     

Mundo ocidental.

Final de século 20.

Todos têm pressa, muita pressa. Uma pressa louca de viver, de trabalhar, de saber mais, de alcançar objetivos, de ter, de realizar, de amar e de ser amado, de preferência sendo feliz antes de envelhecer. O tempo é pouco.

A vida nas grandes cidades pode ser comparada a uma enorme avenida. E a maioria da população anda bem nessa avenida. Automóveis e outros veículos dividem as pistas em alta velocidade. Aparentemente não há regras. Ninguém pára. Nas ruas vicinais, que levam até a grande avenida, carros tentam em vão superar o cruzamento e entrar nela. São pessoas que também têm pressa, compromissos, objetivos. Reclamam, buzinam, nada adianta. Prejudicam-se muito. Nem sinais, pistas de ultrapassagem ou de acostamento. Só consegue entrar na avenida principal quem tem muita sorte, é extremamente hábil na direção ou está desesperado a ponto de cometer uma loucura, arriscando até a vida. É o caos.

A grande avenida tem uma particularidade. Vai se ramificando. As ramificações desembocam justamente nas tais ruelas transversais. Não há outra saída. Assim, quem está na avenida hoje vai estar nas ruas vicinais amanhã.

Para ir adiante, só há uma alternativa. Instituir nova ordem nessa enorme avenida. Mais que isso, será preciso reformular a concepção de avenida. Quem sabe começando por algo aparentemente simples, como a colocação de sinais? Que ninguém se iluda. Com tanta pressa, a maioria dos motoristas rejeitará de imediato a idéia. Como andar mais devagar a partir de agora? Reformular tudo? Quem paga o prejuízo? Além da parada obrigatória nos sinais, a avenida deverá ter pistas para quem precisar andar mais devagar sem ser amaldiçoado pelos motoristas que por tanto tempo se acostumaram a ter a rua principal só para eles.

No início vai ser difícil. Até os apressadinhos perceberem que os benefícios das mudanças virão para todos. Nesse dia, vai ser uma festa. Aí, sim, estaremos a caminho da avenida, digo, da sociedade inclusiva.


Trecho extraído do livro Ninguém mais vai ser bonzinho na sociedade inclusiva (1997/WVA Editora), da jornalista e escritora Claudia Werneck

 

 
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