ADULTOS TAMBÉM TÊM MEDO DO ESCURO

Rabino Nilton Bonder


 

 


A festa de Chanuka nos inspira a ver luz onde já consagramos a escuridão.

Quando a lua e o sol se fazem escuros ao norte, acendemos nossa Chanukiá.

Quando o mundo se faz escuro em violência, acendemos outra vela.

Quando o mundo se faz escuro pela ausência de alguém que se foi, outra vela.

Quando a vida perde o rumo e tudo nos parece sem sentido, outra vela.

Quando não temos mais esperança na possibilidade de mudar, outra vela.

Quando não acreditamos que a vida possa nos oferecer surpresa e frutos, outra vela.

Quando a enfermidade ou a injustiça nos lança às dúvidas, outra vela.

Quando a depressão e a insônia amargam a rotina, outra vela.

Oito velas para aplacar a escuridão, suas sombras e suas assombrações.


Há uma vela, porém, cuja natureza é ao reverso.

Trata-se da vela do shamash*, aquela que serve a todas e da qual se transfere luz às demais.

Essa não é uma luz para dar conta da escuridão, mas a luz da própria escuridão.

E o shamash nos oferece a luz das luzes, que é um pouco de escuridão.

Porque não haverá luz sem preservamos uma centelha de escuridão.

Uma centelha de Mistério através da qual as luzes se fazem possíveis.


A luz acesa nunca conseguiu nos libertar totalmente dos monstros da escuridão.

E é bom lembrar o rabino de Kotzk para quem a mais comum escuridão não é aquela que carece de luz, mas a que se origina do excesso de luz: “Às vezes a luz é tão intensa que fere o nervo ótico. Essa é a razão de nos referirmos aos cegos como saguei nahor – aqueles que estão saturados de luz.”


Ao invés de tentar dominar a escuridão os adultos deveriam se aproximar da escuridão e saber prezá-la e respeitá-la. Afinal, na hora de descansar, as luzes acesas nos agridem enquanto que a escuridão nos embala e abençoa.

Possa Chanuka ser uma festa das luzes não para controlar, mas para se entregar e confiar.

Oferecendo um bom sono e um alegre despertar.

Porque é do escuro do inverno que se reacende a primavera que virá.


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