O TEMPLO, A CONSCIÊNCIA e A ÁFRICA

Rabino Nilton Bonder


 

 

O TEMPLO, A CONSCIÊNCIA e A ÁFRICA

No dia 9 de Av a tradição judaica estabeleceu um ritual de lamentações por conta dos Templos destruídos. Mais do que eventos meramente históricos, a destruição de Templos simboliza a angústia humana de que seus atos possam ser tão insanos a ponto de profanar e arrasar o que lhes é mais precioso.

A função de um templo é conter o sagrado. Nossa consciência é capaz de produzir no vazio do Universo espaços onde reverencia suas belezas e grandezas.

Damos sentidos ao vazio e encontramos D'us. Quando destruímos estes Templos, ao reverso, simbolizamos a capacidade humana de destituir sentidos e retornar ao vazio. A Tora é para nós um caminho na direção de desconstruir o vazio.

E o Templo é o lugar onde a Tora se guarda.

Tisha be-Av é o ritual de se perguntar como pode? Como permitimos que nossos atos queimem e aniquilem aquilo que construímos ao custo de nossas vidas e de seus sentidos? Esse desperdício intolerável nos faz lamentar.

A função do lamento é dar expressão as profundezas da alma. Com o fim do Holocausto seus sobreviventes olharam o que restara a sua volta e exclamaram:

Como pode? Como podemos permitir algo assim? Como as pessoas se calam diante de tanto desperdício em vão?

Nunca mais! Nunca mais nos calaremos. Onde quer que a bestialidade se apresente seremos os guardiões da sanidade que não permitirá que se destruam templos.

É a consciência humana que constrói Templos e é ela que fala com D'us e é ela que lamenta e chora por sentido.

Mas é a mesma consciência que é capaz de esquecer, capaz de ignorar e se fazer indiferente e é ela que destrói os templos. Neste dia de se lamentar vamos estar lembrando de nossa solidão e nossa tristeza referenciados pelo desperdício de vidas hoje em Darfur, no Sudão, talvez no maior crime de nossa contemporaneidade e para o qual tantos de nós nos permitimos ignorar em ignorância.

Venha celebrar conosco esse lamento.

Ele tem duas faces. A face do horror que o lamento desperta pelo que já foi no passado e a face da indignação que desperta diante da passividade do presente.

Venha honrar a nossa ancestralidade e suas construções destruídas e venha falar sobre formas de ação para que o Templo de nossos valores e crenças não seja varrido por nosso silêncio e hesitação. Venha nesse dia de Tisha be-Av protestar com seu lamento pela destruição que a inconsistência, a hipocrisia e a indiferença causam em nosso mundo.

Desse lamento profundo nascerá o Messias. Não nascerá da construção de mais um Templo, de um terceiro Templo.

Nascerá da capacidade de não destruir novos Templos. Hoje, em nosso mundo, a chance de sua chegada depende de nos voltarmos à África. O Messias é a celebração do fim da destruição perpetrada por nossas próprias mãos.

Bim`hera be-iamenu. Que seja prontamente, em nossos dias!

Rabino Nilton Bonder


MENU